quarta-feira, 15 de julho de 2009

PECADO CAPITAL




Desde os tempos de Barbie eu não me via no papel de dona de casa. Se bem que a minha Barbie tinha banheira de hidromassagem e não tinha fogão… Pois é, o fato é que minha mãe não me ensinou a cozinhar e sempre repetiu que era para estudar, para um dia trabalhar e pagar uma pessoa que cozinhasse para mim. Nunca dependa de homem, minha filha! Filha obediente, foi o que fiz. De tanto estudar acabei me formando em 3 cursos superiores, talvez para combater algum complexo de inferioridade imputado em mim por meus irmaos mais velhos, que como em quase toda família, têm ciúmes do caçula e o testam de todas as formas possíveis, nas brincadeiras boas e de mau gosto. Como sofri nesta vida de caçula! Mas nesta desvantagem hierárquica, aprendi a me virar bem, só.

O fato é que trabalho sempre veio em primeiro lugar na minha vida. Ou melhor, em segundo, terceiro e quarto também. Até muito pouco tempo eu era do tipo que ficava sem entender uma pessoa que não gostasse de trabalhar tanto como eu. Sonho de casar, como a maioria das mulheres mineiras? Não! O sonho sempre foi de me dar muito bem na minha profissão. E achava que o caminho pra isso era o da formiguinha. Nunca reclamei de trabalhar 14 horas por dia, de não tirar férias, de perder as festas de família por uma gravação. Tanto que nos últimos 3 anos tirei apenas 20 dias de férias e acumulei dois trabalhos fixos e vários freelas simultaneamente. Resultado: quase tive um surto de estresse. Depois de aprender 3 línguas, viajar a mais de 20 países e passar 12 anos da minha vida investindo na minha carreira e tendo algum sucesso nela, comecei a pensar que o dinheiro que eu ganhava nåo pagava tudo o que eu estava deixando passar. O cache parecia não ser suficiente para compensar tanta dor de cabeça. Num impasse contratual, decidi recusar a proposta da empresa onde eu praticamente morei nos últimos anos. Me vi, pela primeira vez em mais de 3 décadas, na possibilidade de dedicar mais tempo `a uma função na qual eu sou quase virgem: dona de casa profissional. Me tornei praticamente uma pecadora, principalmente para uma pessoa que mudou de cidade há 5 anos para investir na carreira e que sempre achou mais interessante qualquer pessoa que trabalha. E nåo deixa de ser.

Tá bom, estou exagerando. Não me tornei dona de casa no período integral. Eu tenho um trabalho fixo que me consome 1 hora do meu dia. Se parece muito para um bicho preguiça, parece muito pouco para uma formiguinha. O fato é que estou tentando deixar de ser formiga, para tentar me transformar em borboleta. Quero voar alto, encantar que estiver por perto e partir com leveza. Não ficar muito tempo parada e ser admirada por isso. Para minha própria perplexidade, só na última semana recusei 3 possibilidades de trabalho fixo. É que depois de alguns dias na minha nova função de gerente da minha vida (por onde andava minha vida pessoal antes mesmo?), descobri outras delícias perdidas em algum lugar do passado, como tomar um chope no almoço com um amigo querido, encontrar uma amiga e vê-la dar banho na filha, conseguir assistir a um filme no cinema durante a semana, reparar nas cores das flores, ir ao médico (nossa, agora eu posso mesmo cuidar de mim um pouco?). E não pretendo abrir mão disso tudo por uma exposição na TV. Nem voltar a me viciar em pontos de Ibope. Parece-me que a televisão virou um palco de gente que quer aparecer a troco de quase nada. Mas não quero analisar isso agora para não fugir do tema.

Sei que na minha nova função de dona da minha vida, preciso resolver mil coisas da casa que está em fase de acabamento… e parece acabar nunca! Mas este é um capítulo a ser escrito a parte, grafado em negrito: as mil funções que uma casa requer, antes mesmo de se tornar uma casa. Virei a melhor amiga do marceneiro, que me liga 24horas por dia. Aprendi a entrevistar e selecionar empregada doméstica (e ainda acho que isso daria um curta bem divertido). Tenho me tornado especialista em pendurar quadros, arrastar movies, escolher plantas e árvores, educar cães e cobrar diariamente uma equipe que parece não querer sair de casa. Por hoje é só! Como os pintores, o marceneiro e a empregada já foram acho que está na hora de ligar a hidromassagem. E lembrar dos tempos de Barbie.

DENISE BARRA

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